quarta-feira, 8 de setembro de 2010

O Túmulo dos Vagalumes - Hotaru No Haka, 1988



O Studio Gubli, criado por Hayao Miyazaki e Isao Takahaka em 1985, é ao lado da Pixar o melhor estúdio de animação da atualidade. Ambos conseguem criar universos interessantíssimos, que nos comovem por sua beleza e grandiosidade, tornando-se inesquecíveis, como o comovente longa metragem, O Túmulo dos Vagalumes, que foge muito aos conceitos de animações japonesas, com histórias fantásticas e criaturas fofinhas, engraçadinhas e destinada a criancinhas (tudo “inha”). Não que as animações sejam assim, muito pelo contrário, hoje as animações atingem todos os gêneros possíveis, desde western ao erótico. Há certo preconceito com os filmes de animação, sendo taxado como um passa-tempo para crianças e etc., é uma pena, porque hoje temos animações que nos fazem refletir sobre problemas cotidianos, como Up - Altas Aventuras, - onde vemos o protagonista Carl deixando seus sonhos passarem como o tempo e esquecendo que chegará o dia que será difícil realizá-los – e problemas com o mundo, como nesta obra magnífica.
O roteiro gira em torno do relacionamento de dois irmãos, Setsuko e Seita, em meio ao devastado Japão do final da II Guerra, onde após perderem a mãe em um dos constantes ataques à sua cidade, e com o pai desaparecido, passam a viver com parentes, onde enfrentam problemas de relacionamento com os mesmos levando-os a morar em um abrigo abandonado.
O roteiro não nos priva de cenas chocantes (confesso que é a primeira vez que vejo um filme de animação mostrar um corpo rodeado por vermes). Mesmo se passando em uma guerra, o diretor/roteirista, Isao Takahaka, se mostra inteligente ao colocar tais cenas de forma orgânica em relação à história, nunca se tornando exageradas. Takahaka ainda é elegante ao retratar suas seqüências, como no caso da belíssima elipse em que vemos uma lata enferrujada e posteriormente a vemos nova em folha, representando o retrocesso temporal da história. O diretor ainda conseguiu introduzir na narrativa, simbolismos que enriquecem ainda mais o seu trabalho, como na hora em que vemos Setsuko e Seita preparando-se para dormir no abrigo e levam vários vagalumes para dentro, onde anteriormente reinava a escuridão; sendo a representação da Guerra e de todos os seus horrores, onde a única coisa que ilumina as trevas são pequenos pontos de luz (os vagalumes), representando a rara inocência de Setsuko e Seita, e um sinal de esperança para tempos tão terríveis.
Admirável, também, é a eficaz direção de arte e os figurinos, que acompanham de forma inteligente a degradação psicológica e corporal dos protagonistas, ficando claro ao vermos o abrigo bem cuidado para posteriormente vê-lo acabado e a cidade que após um ataque se assemelha a destroços em meio a um grande deserto. Já os figurinos, são primeiramente vistos alinhados e limpos, tornando-se mais ao final trapos sujos e remendados.
Mas com certeza o melhor do filme é observar duas figuras tão cativantes como Setsuko e Seita, e o relacionamento de amor que existe entre eles. É comovente ver o esforço de Seita em proporcionar bons momentos para a irmã, mesmo em meio a tantas atrocidades, sempre a tratando com inteira compreensão e atenção. O amor entre os dois é retratado com momentos incrivelmente emocionantes pelo roteiro.
O Túmulo dos Vagalumes é um dos dramas mais emocionantes que o cinema já fez. Desde o início até o final é difícil segurar as lágrimas. E é interessante observar que justamente em uma animação podemos ver figuras tão verossímeis e cativantes que nos façam refletir, não apenas após o filme, mas por uma vida toda.